quarta-feira, 24 de abril de 2019

Estimado rombo

A corrupção provoca um rombo de R$ 200 bilhões por ano nas contas públicas. Esta é a estimativa corrente sobre o prejuízo provocado pelos corruptos do Brasil.
Ou seja, em dez anos serão R$ 2 trilhões perdidos pelo ralo instalado nos porões do aparelho onde funciona a organização criminosa que se apoderou do país.
Cá entre nós, pode ser muito mais do que isso! Esta estimativa leva em conta a taxa média de propina cobrada nos contratos investigados na operação Lava Jato, mas, se as investigações chegarem em outras áreas, suspeito que o valor final seja muito maior.
A título de exemplo, cito os valores desviados da construção e reforma de escolas no estado do Paraná, investigados na operação Quadro Negro. Há projetos onde nada foi construído ou reformado, ou seja, praticamente todo o valor foi desviado, o que equivale a uma taxa de propina de 100%!
Mas tomemos por base os R$ 200 bilhões por ano. Afinal, ser conservador está na moda.
Admitindo que “apenas” R$ 2 trilhões serão roubados dos cofres públicos nos próximos dez anos, seremos “aliviados” de um montante correspondente ao dobro da “economia” pretendida com a propagandeada reforma da previdência.
Você acha estranho? Eu não.
Não esperava outra coisa. Afinal, a sistemática eleitoral em vigor não poderia produzir outra coisa além dessas aberrações. A última reforma política não vingou, e foram mantidas as mesmas regras que favorecem a eleição e reeleição de uma maioria de oportunistas e corruptos, herdeiros de currais eleitorais e apaniguados dos “donos” de partidos. E a minoria que foge à regra não tem força para fazer mudança alguma.
O que me estranha mesmo é a falta de reação da população.
Pois é a parcela que mais paga tributos no nosso país que está sendo chamada a pagar também a conta deixada pela irresponsabilidade, pela incompetência, pela atitude criminosa dos corruptos que sangram os cofres públicos diariamente, sem vergonha e com requintes sádicos.
E a reforma política, aquela que pode mudar este estado de coisas de forma duradoura, com um sistema eleitoral que permita a eleição de gente mais séria e honesta, ajustada e efetivamente comprometida com o bem da nação, sequer é lembrada.
Ninguém fala disso. Mas somos induzidos a aprovar mais um estimado rombo em nossos “bolsos” (para não usar termos chulos, que também estão na moda), sob o pretexto de cobrir o rombo que não produzimos.
E nós sabemos o que vai acontecer daqui a mais alguns anos. O assalto aos cofres públicos vai aumentar (afinal, eles já estão dando um jeito de “estancar a sangria”, com tudo, como disse um dos corruptos gravados durante investigações) e “alguém” vai ter que pagar pela conta ainda maior. Sabe quem? Eu sei.

terça-feira, 16 de abril de 2019

Senso e censura

Eu aqui, de saco cheio,
calculando a regressão...
A censura (ô termo feio!)
é cagaço de cagão!

Mais que o podre do recheio
e o mal cheiro da expressão,
a suspeita, mesmo ao meio,
encabeça a discussão.

Se na base da mordaça
o sujeito escolhe agir,
só se pensa em mais trapaça!

Este é meu entendimento,
e você há de convir
que o fedor nomeia o vento.

sexta-feira, 5 de abril de 2019

Razão de arrogância

O título desta crônica pode parecer estranho, mas há razão para tudo, qualquer coisa.
Nenhuma manifestação de arrogância é arrazoada, pois a soberba é conduta típica de quem não tem o juízo no lugar, de quem não percebe que o mundo é plural, de quem não enxerga os outros e suas razões.
Os outros podem estar errados em muitas situações, mas nós também podemos estar errados em outras tantas. E é a consciência de que somos todos humanos e, portanto, todos falíveis e iguais em essência, que nos permite ser razoáveis ao fugir da arrogância.
Mas, ao que me parece, não é isto que se vê quando se analisa o grupo que conduz ideologicamente o “novo” governo. Os influenciadores ideológicos. Os que defendem as estranhas bandeiras que contestam, por exemplo, o heliocentrismo, a física quântica e, agora também, a história nacional e mundial.
Não sei que relação estas bandeiras possam ter com as propostas de “reformas” que alguns aguerridos arrogantes têm se batido em defesa. Mas desconfio que haja alguma ligação, sutil, mas real.
Por exemplo, a deformação da previdência social que o ministro da economia tanto se esforça em impor. Parece-me que a negação dos princípios da solidariedade e do mutualismo, mundialmente adotados em sistemas previdenciários, tem alguma ligação não muito bem visível com a negação da história nacional, no ponto relativo ao período da ditadura (que outro nome usar?), de 1964 a 1985.
Naquele tempo, não havia debates no congresso ou na sociedade. As decisões eram tomadas e implantadas na força da caneta (ou do canhão que ela simbolizava). Passava-se por cima das questões nacionais como um tanque de guerra passa por cima de qualquer coisa em seu caminho.
E as recentes cenas da sabatina perante a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara me deram a impressão de que o ministro se sente como se fosse um tanque de guerra. Assim: ele teve uma ideia e segue como se não houvesse outras possibilidades de se abordar o tema da previdência social, como se qualquer abordagem diferente fosse apenas um obstáculo a ser vencido por suas poderosas esteiras.
Num ato falho, ao perguntar se os deputados tinham medo de alterar as regras propostas para os militares, não sei bem se ele deixou transparecer o seu próprio medo, já que ele não enfrentou os militares quando do envio da proposta, ou se quis dizer que também os militares são apenas um pequeno e desprezível obstáculo.
A arrogância com que o ministro se comporta é, como toda arrogância, desarrazoada. Falta-lhe razão.
E falta razão, a ele e aos que com ele conduzem o plano ideológico em marcha, ao pretenderem destruir com uma canetada todas as garantias sociais duramente conquistadas por nosso povo ao longo do tempo. Isso é a negação da história, do trabalho, dos valores construídos por todos nós. Afinal, estávamos todos errados? Será que temos que ser todos internados? Só estes poucos (ainda bem!) “iluminados” é que estão certos?
Este ministro é um estereótipo do chefete que muitos já tivemos que enfrentar, aquele cara que precisa manter a fama de mau, que bate na mesa e diz: “manda quem pode e obedece quem tem juízo”.
Pois não é justamente por não ter razão que os autoritários precisam da força?
E é óbvio que há uma razão para eles serem assim. Mas isso é coisa para um psicanalista. Eu fico por aqui.