quarta-feira, 1 de maio de 2019

Sintoma

Aquilo que é sentido. O que dá sinal e indica algo prestes a acontecer. O que é dito ao médico para descrever uma suspeita de doença. O antes do diagnóstico.
Há muitas definições possíveis para “sintoma”. Mas não é preciso abrir o dicionário para se saber do que se trata.
E os sintomas estão por aí. Em nós e ao nosso redor. Nas pessoas com quem conversamos. Naquelas em quem confiamos e nas que não confiamos. Os sintomas são algo tão humano quanto universal. E nós não conseguimos nos livrar deles. Podemos até achar que sim, mas sabemos que não.
Eu particularmente tenho convivido com uma sensação de mal-estar já quase antiga. Quase acostumada. Quase esquecida.
Esta sensação resolveu me acordar.
E então percebo que, na melhor das hipóteses, tudo está pior. Tão pior que não quero (não consigo) falar das coisas mais importantes. Sequer pensar nas coisas mais importantes.
Acho que é por isso que tenho pensado tanto na política, na economia, nas maluquices do poder. Na insanidade eleita para ser guia do nosso cotidiano.
Queria reformar esta condição, mas tudo o que consigo é sua deformação.
Pelo menos, se servir de consolo, dei-me conta disso.
Assim, abro esta crônica para falar de um sintoma de menor importância: a sensação de que seremos quase todos violentados por uma reforma nas nossas expectativas de envelhecimento, que já nem eram tão estimulantes!
Parece que os trovões indicam não apenas uma tempestade lá na frente, mas uma que está no nosso encalço, bafejando em nossa nuca. Pois, apesar dos discursos ufanistas, as notícias não deixam dúvida: aumenta o desemprego, aumentam os preços, há censura e déficit no comércio internacional...
Não se trata de estimativas ou projeções. Este tipo de coisa já é notícia!
E uma coisa que em outros tempos seria notícia de grande impacto, as expectativas do mercado, retratadas na pesquisa divulgada pelo Boletim Focus, do Banco Central, já não tem importância e é matéria publicada quase no rodapé do noticiário.
Por isso, falo desta pesquisa também. Afinal, esta não é uma crônica sobre coisas desimportantes?
Esta pesquisa revela, por exemplo, que as estimativas do mercado para o crescimento do PIB são decrescentes. E, outro exemplo, que as estimativas para o aumento dos preços são crescentes. E, para provar a falta de importância destes sintomas, demonstro que as tendências destas estimativas mudaram de direção a partir da divulgação da proposta de emenda constitucional de reforma da previdência elaborada pelo atual governo. Veja na figura abaixo. Os gráficos foram extraídos do Relatório Focus de 26/04/2019. As indicações dos pontos referentes à divulgação da PEC nos gráficos são intervenções deste cronista.


Mas chamo a atenção e reitero que são sintomas desimportantes. Nada disso se encaixa no discurso em vigor.
São meras especulações sintomáticas!
Talvez lastreadas em visões igualmente desimportantes, como, por exemplo, de se considerar que o que está sendo chamado de “economia” possa ser apenas um enxugamento de renda, cuja maior parcela seria destinada ao consumo. Ou então, outro exemplo, de se considerar que são medidas recessivas e que resultarão na redução da atividade econômica e agravamento da relação da Dívida Pública versus o PIB. Ou ainda, mais um exemplo, de se considerar que pode haver uma degradação das condições sociais, aumento da pobreza, da violência e da insegurança, cujas consequências refletirão em custos de serviços públicos e aumento da dívida.
Mas, claro, tudo isto é fruto de uma reflexão desimportante. De nada importa que alguns reles agentes econômicos enxerguem algo diferente do discurso oficial e estejam se antecipando às imaginadas consequências. Afinal, a reforma proposta será a redenção de todos os males e problemas da nação. Depois dela, choverá investimentos, o sofrimento será transformado em regozijo e nosso povo poderá gozar da riqueza prometida.
Acha não?